Moléstia Canônica

Amor amargo, farpa escura da ilusão. Sentimentos atropelados e inundados de paixão. Abram os portões e libertem o opressor. Entregue sua alma àquele que te engana, afinal, o que mais vale... Um tiro no peito emudecido pela loucura ou a verdade que lhe rasga os olhos e sangra desgostosa? Seus planos foram frustrados, dilacerados e emoldurados como peças de um quebra-cabeça sem solução. Devia confiar naquele que te fez sorrir, mas preferiu costurar a boca ponto-a-ponto como um não. Boneca de pano que vive de esmolas de um rei felpudo, entregue às traças e a espera de um fantasma, de um norte escuro. Luzes de estrelas lhe mostraram o caminho, a fizeram provar o mel que lhe faz jus, mas preferiu - tola que é - beber o fel como um vinho. Destrua o que puder dos que te querem bem, absorva tudo que lhe oferecerem sem pestanejar, mas devolva a mentira com gosto de sangue nos lábios a cada beijo bipolar. Seu vestido alvo deveria ser a esperança. Em prantos, diz viver o fim dos tempos, mas jamais deixará o sarcasmo, ó vil criança. Dama expurgante da insanidade, já não é humana. Bestial de Nice, toma os telhados e avança sobre seu alvo, arranca-lhe o coração e devore sem pena, brinque com seus olhos e roa seus ossos, expurgue sua dor em fome de ódio - é o que faz e fará. Se entregue enfim ao seu destino. Mergulhe no mar e morra santa, não virgem. Salgada pela culpa, doutrinada pela maldade, mas sempre fiel a seu ardor. Com muita dor e vergonha digo a verdade, quando se for amor... Serei saudade.

Amizade na primeira infância

    Bem, apesar de hoje em dia ser ‘modinha’ as pessoas quererem passar uma imagem de antissocial e isolado do mundo, na minha época isso era visto como certo problema, digno de pena e comentários cheios de sentimento por familiares e conhecidos. Eu não acho que poderia me classificar nesse quadro exatamente, porque apesar de não falar muito com outras crianças, eu nunca fui de evitá-las, ou seja, pelo menos não nasci assim, né? O que foi se desenvolvendo ao longo dos anos foi uma capacidade própria de não precisar de companhia para levar a minha vida. Alguns podem achar isso uma grande tristeza, mas para mim sempre foi natural falar e brincar sozinho, por exemplo. Como disse anteriormente, não me considero como um antissocial, mas com certeza  tenho um modo muito seletivo de escolher minhas amizades. Acho realmente importante criar um vínculo com alguém e não apenas uma relação de falar 'vez ou outra' e querer parecer melhores amigos. Amizades que quando você está sozinho e lembra da pessoa e das situações em que estiveram juntos, ri e sente saudades de verdade. Eu costumo classificar meus amigos com muito carinho, mas de forma bem específica. Tem aquele amigo de falar besteiras, outro de falar de jogos, uns que vão estar ali para me dar apoio, os que são meus amores profundos e os que irei constantemente cuidar com carinho e atenção quando precisarem. Enfim, meus amigos são muito especiais para mim e especiais a tal ponto que reprimo minhas frustrações e tristezas ao máximo perto deles para não contagiá-los com coisas ruins e acredito fielmente que um sorriso faz toda a diferença no dia-a-dia de alguém. Meu lema é “Ouvir e sorrir é fazer alguém feliz”, ou quase isso...

A Musa

Meia-noite. Passam-se os sons, ficam-se as dores. O orgulho aqui sucumbe à música de amores. Formas distantes completam a sua imagem, imperfeita - o vício é muito mais que a paisagem. Seus erros e pedaços se distorcem em minha mente, mais profundo em minha carne, serei eu um louco? Doente? O fulgor da loucura preenche seus olhos, derramando lágrimas de açoite. Solitárias. Absolvidas no silêncio daquela noite. Seus dedos gentilmente dançam pela peça errante, um ódio que ecoa em um delírio, um torpe instante. Quis gritar e despetalar cada flor em desagrado do desejo, mas meu corpo cheio de pudor, meu ser imaculado desmontava em mais um dia sem teu beijo. A Lua impiedosa surge a pouco da aurora. A melodia se entorta e dilacera: lápis, papel e minha doce Manuela. Dedos desabam sobre a faca e a lâmina fria enfim lhe dá a solução, o cabo desalmado não lhe poupa nada, toma-lhe de assalto o coração. Vermelho. Os lábios dela se espalham em formas brutas no espelho. Seu rosto está no piso, mas o meu toma seu lugar. Num riso e num suspiro, é ela que então vem me matar...
"Enfrentam as ondas. Testam-se os barcos. Tempestade, marola do meu ser. Boia como pena, teima em desfazer."